Desde 1984
Janaína de Oliveira
14 de Outubro de 2022
Essa tal liberdade

Como muitos sabem, eu sou a terceira de uma família de sete filhas. Quando eu comecei a sair para me divertir na adolescência, era eu a porta voz das reivindicações junto ao meu pai, que sempre foi mais rígido e conservador. Muitas das vezes em que pedíamos para sair, recebíamos um sonoro “não!”. 

Até que, um dia, já que eu não era a porta voz à toa, mandei um: “Por que não?”. E recebi de volta: “porque não...”. Retruquei: “Porque não” não é a resposta. A partir daí, meu pai começou a mudar as estratégias e até passou a conceder mais as nossas saídas.

Uma vez ele me disse: “Você só quer saber da sua tal liberdade”. Disse isso como se fosse a coisa pior do mundo. Por outro lado, eu ali sabia que essa seria uma das palavras que mais me definiriam enquanto pessoa. Minha professora Ione Paiva, na Emip, dizia que eu deveria fazer Letras, porque meu texto era muito bom. Já o saudoso professor Migdon não perdia a oportunidade de me cutucar: “Você tinha que atuar no criminal. Você é boa de briga”. Não fui nenhum e nem outro. Fui trabalhar no Jornal A Notícia, onde peguei gosto em colocar as minhas ideias no papel e fiz Direito, já que a retórica sempre foi um dos meus fortes. Mas, foi na Caixa que dediquei e ainda dedico grande parte da minha vida profissional.

O gosto em discutir ideias e poder expressar as minhas convicções é quase um mantra na minha vida. Quando essa minha liberdade é cerceada, isso me fere de morte. Todos que convivem comigo sabem disso. Chega a ser até um defeito, porque às vezes, falar o que se pensa pode ofender alguém. Já decepcionei muitas pessoas e também já pedi perdão pelas palavras ditas. Enfim, a maturidade me fez entender que as vezes ficar calada também é uma forma de expressar e que tem diálogos que não compensa travar.

Escrevi tudo isso para lembrar de um dos nossos direitos fundamentais: a liberdade. E a liberdade de expressão é uma de suas várias faces. O indiano Amartya Sen, que já ganhou o Nobel, escreveu o livro “Desenvolvimento como Liberdade”. Segundo ele, a nação se mostra cada vez mais desenvolvida à medida que possibilita a ampliação das liberdades de seu povo. Não adianta ser um país economicamente desenvolvido e ter seu povo escravizado na forma de pensar.

O pensamento, a criatividade e a nossa capacidade de dialogar é o que mais define o ser humano. É o que nos diferencia da inteligência artificial. Isso é mágico. Isso é um dos maiores presentes que recebemos da evolução. Então, o que estamos fazendo com essa nossa Liberdade? O que estamos fazendo com o outro que pensa diferente de nós? Como podemos simplesmente anular os veículos de imprensa em detrimento de uma avalanche de postagens, de procedência desconhecida – para não dizer duvidosa? 

Neste ponto, acredito que uma das maiores ameaças à humanidade são as redes sociais. Estudos já mostram como as redes sociais estão influenciando a vida das pessoas e o futuro da democracia. Portanto, o que você está fazendo com a sua capacidade de dialogar?

Tem um livro infantil que eu adoro. Chama-se “Pinote, o fracote, Janjão, o fortão”. Cansei de lê-lo para o meu filho. Janjão é o garoto que, por ser fortão, se julga o rei da turma e que pode controlar a todos. Até ser confrontado por Pinote que, ao ser obrigado a sorrir de uma brincadeira sem graça, responde: “Eu posso sorrir com a boca. Mas, meu pensamento...”. Que mensagem fantástica que este livro nos traz: O pensamento é livre! Não importa o que o Janjão faça, ele nunca vai mandar no pensamento de Pinote. Simples assim...

Então, aos opressores de plantão, aqueles que acham que podem mandar na vontade alheia, vocês simplesmente não podem. Não conseguem! Aprendam com Pinote. Vocês só possuem a alternativa de dialogar. Coloque-se no lugar do outro e enxergue as coisas sob a perspectiva dele. Talvez assim, você consiga persuadi-lo. Ou ao contrário, perceber que o outro lado tem razão.

Oprimidos, não aceitem nenhuma intimidação de qualquer natureza, seja ela financeira ou emocional. Saibam que a sua vontade deve ser soberana. Seu pensamento é livre e dele, e somente dele, devem ser formadas as suas convicções e decisões. Desconfiemos de discursos que pregam a uniformidade; de governos que impõem dirigismo cultural ou religioso e oprimem a arte e a ciência. A diversidade é inerente à natureza humana e ela deve ser preservada.

Em tempos de eleição, bom frisar que compra de voto é crime. Denuncie a prática junto a Justiça Eleitoral. Coação de eleitores por empregador também é proibida. Isso é assédio eleitoral. Também denuncie junto ao Ministério Público do Trabalho. Enfim, façamos como bons mineiros e sigamos a máxima de nossa bandeira: Liberdade ainda que tardia!

 

(*) Janaína de Oliveira Cotta é advogada, ex-repórter e ex-editora do A Notícia

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