Desde 1984
Marcos Martino
03 de Junho de 2022
Coletânea de vida do Martino: por que não?

Sou brasileiro, nasci em Alvinópolis em 7 de março de 1964, 24 dias antes da tomada do poder pelos militares. Durante 28 anos, soube apenas o que era permitido. Quando fiquei sabendo que tinha sido um golpe, me senti traído. Nos foi ensinado que nossos nobres militares, num gesto de heroísmo, expulsaram os comunistas do Brasil, esses “seres próximos do capeta de tão ruins, “comedores de criancinhas e hereges ateus”. 

Mas a verdade emergiu em minha vida e, com ela, a revolta. O preâmbulo foi apenas para situar a época do meu nascimento e juventude. Crescemos todos sem conhecer muito bem essas verdades, abafadas nas bocas dos nossos pais, que temiam a mão pesada do estado autoritário, ou mesmo por ignorância. Porém, essa descoberta, ao mesmo tempo que me causou indignação, influenciou sobremaneira a minha criação e tudo o que veio a partir daí.

Logo no fim dos anos 70, começaram a acontecer festivais de música em Alvinópolis. E a pacata cidade, naqueles dias, era invadida por gente de todos os lugares e de todos tipos: a pequena “Alvipa” virava uma “babel cultural”. Os artistas traziam outras culturas, olhares mais abertos, mais cosmopolitas, mais descolados da realidade conservadora de uma cidade pequena do interior de Minas. 

Aquilo sempre foi muito excitante. Uma abertura de possibilidades, uma janela para o que havia fora da terra natal. E aí, nos arroubos da juventude, eu e um grupo de amigos desejamos também beber dessa fonte da música. Inspirados, passamos compor e a participar dos festivais locais com o Verde Terra. Um dia, tomamos coragem e começamos a viajar pelo estado. Pegamos o jeito, fomos evoluindo no trabalho. Primeiro, para agradar os júris, o público e, claro, a nós mesmos. E deu super certo. Ganhamos um bocado de Festivais e algumas músicas, como “Nós os Loucos”, “Do Outro Lado do Espelho” e “Interior”, venceram vários concursos e tocaram bastante nas rádios, gerando grande repercussão. Gravamos um disco elogiado e que deixou saudades. 

Depois me mudei para BH e com novos parceiros, criamos a banda de rock República dos Anjos. Fizemos muitos shows e deixamos como legado um CD, que considero, um trabalho de grande qualidade. Não conseguimos o estrelato, mas tivemos um relativo sucesso, com reconhecimento da mídia, do público em nossos shows e uma boa projeção. 

Depois enveredei para área da publicidade e virei compositor de jingles, onde também obtive bastante êxito. Fiz centenas de músicas comerciais, spots, vídeos e outras peças publicitárias. Algumas imortalizadas na memória popular. Mas o fazer artístico é quase fisiológico, uma necessidade espiritual, psíquica... vai saber. Nunca parei de compor, não parei de tocar e de lançar minhas músicas e ideias. Recentemente, criei “Véi também é gente”, canção com clipe colaborativo que viralizou, como protesto e chamando a atenção para os idosos da ativa. 

Com grande alcance nas redes, muita gente começou a me dizer: - “Por que você não faz um show a partir dessa música, relembre sua carreira. Por que não uma grande coletânea do Martino?” E não é que foi uma boa ideia? Por que não? Afinal, sou um véi teimoso, artista, daqueles que quando cisma, vai fundo e persiste! Pode ser a despedida ou mais um (re)começo. Abram alas que vamos tocando em frente, como disse Renato Teixeira. Em breve, vem coisa boa aí. 


(*) Marcos Martino é alvinopolense, compositor e ativista cultural

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