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23 de Outubro de 2020
Ministério Público e Sintramon investigam denúncias sobre Crê-Ser
Empossada no início de agosto, a nova diretora-presidente da Fundação Municipal Crê-Ser, Naira Ananias, já enfrenta uma série de denúncias sob sua gestão. As queixas envolvem a relação com os funcionários, má gestão de materiais, desvio de bens da fundação, entre outros temas. Algumas delas foram apresentadas ao Sindicato dos Trabalhadores do Serviço Público de João Monlevade (Sintramon), outras, diretamente ao Ministério Público e outras ainda ao A Notícia.

O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) já notificou a prefeita Simone Carvalho (PTB) a dar esclarecimentos necessários em prazo de 15 dias. O Sintramon também oficiou a Procuradoria Jurídica a respeito das denúncias e espera uma resposta.

Boa parte das acusações envolve a relação da diretora com os trabalhadores da Fundação Crê-Ser. São denúncia sobre rispidez, tratamento autoritário e assédio moral no trato com servidores, enquanto comissionados estariam recebendo reajustes injustificados ou gratificações, mesmo durante o período eleitoral.

Alguns dos funcionários, incluindo aqueles dos grupos de risco à Covid-19, teriam sido obrigados a retornar ao serviço, e não estariam recebendo os equipamentos de proteção individual. Auxiliares de serviço geral, por exemplo, teriam sido obrigados a lavar os carros da fundação.

As denúncias também apontam outros fatores na gestão de Naira Ananias. Móveis, equipamentos e brinquedos em bom estado teriam sido descartados. Obras desnecessárias e, para o conforto da nova diretora-presidente, teriam sido realizadas sem a orientação de engenheiros e com funcionários que não foram contratados para tal. Placas de identificação e que fazem parte da história da entidade teriam sido retiradas pela atual diretora

Para tanto, placas de inauguração e de homenagens teriam sido arrancadas das paredes. O cardápio para crianças e trabalhadores teria sido alterado porque Naira teria reclamado do sabor e do tipo de comida servida, incluindo refrigerantes, doces, frituras e massas, contrariando orientações de nutricionistas. Além disso, os funcionários teriam almoçado no local de trabalho, mesmo recebendo auxílio-alimentação de R$250,00.

Há ainda denúncias mais graves, como aquela que diz que um computador da fundação foi utilizado para fazer campanha eleitoral durante o horário de expediente. Naira Ananias ainda é questionada por, supostamente, deslocar-se de casa para a sede da Crê-Ser, no bairro Baú, em carro da instituição.

Um dos motoristas da entidade teria tomado banho nos banheiros destinados às internas com a anuência da diretora-presidente, usando itens de higiene pessoal das jovens, para ir a uma festa na casa de Ananias. Na volta, ele ainda teria saltado o muro da fundação, sendo flagrado por um vigia, e dormido num carro de serviço. Segundo denúncias, câmeras de segurança registraram os fatos.

As explicações de Naira

Na manhã de quarta-feira (21), Naira Ananias recebeu a reportagem do A Notícia na sede da Fundação. Ela disse estar em período de férias, mas preferiu responder pessoalmente a cada uma das acusações, sem passar pela assessoria de Comunicação da Prefeitura. O setor também recebeu os questionamentos, mas não respondeu ao jornal.

Naira negou ter tratado qualquer servidor com autoritarismo, tampouco ter cometido assédio moral: “Eu já sofri com isso em outro trabalho, já fui humilhada na frente de todos”. Naira afirma que houve apenas uma reformulação na equipe de apoio ao pregão nas compras para a fundação, negando que tenham sido concedidas “gratificações individuais”. Quanto à sua secretária, ela diz que apenas a trocou de cargo, já que ela cursa a universidade, mas ocupava um posto que exigia o Ensino Fundamental.

Quanto ao descarte de materiais, a diretora-presidente da Crê-Ser diz que eles estavam severamente danificados e irrecuperáveis, já tendo tido baixa da lista do patrimônio da Fundação, como manda a lei: “Tínhamos sucata de até 25 anos guardada, móveis, brinquedos, sapatos e roupas velhas, tudo que já não servia mais. Tínhamos quatro geladeiras enferrujadas e velhas, máquina de escrever que não escrevia, uma cadeirinha quebrada. No fundo de um quartinho, havia até uma aranha caranguejeira”.

Ananias também diz que melhorou a alimentação fornecida a crianças e funcionários: “Num dia, quando eu cheguei, era servido caldo de mandioca, arroz e feijão no almoço. Duas das adolescentes nem queriam comer. Agora, em todos os dias, há saladas de várias qualidades, carne, arroz, feijão e uma massa”.

O refrigerante, segundo a diretora-presidente, foi comprado com seu próprio dinheiro e é enviado às crianças uma vez por semana. Ela também explicou que vários dos servidores que fazem suas refeições na Crê-Ser trabalham sob regime de doze horas, o que os obriga a permanecerem na instituição. Segundo ela, os funcionários agora dispõem de um refeitório próprio para eles almoçarem, quando antes tinham que comer no pátio.

Naira considera as denúncias sobre as obras “uma mentira deslavada”. Segundo ela, o serviço foi feito por funcionários acostumados a fazerem pequenos reparos e que estavam ociosos, mas que isso não caracteriza desvio de função. Entre as intervenções, estariam a construção de um muro, no lugar de outro, danificado, que “não precisaria de um projeto de engenharia”: “Só a base deste muro tem 60 centímetros de profundidade, e as colunas desse muro têm 80 centímetros de espessura. Se for uma obra mal-feita, não sei o que é uma obra bem-feita”.

Outros serviços serviram para recuperar áreas degradadas e para criar espaços com mais privacidade para que os servidores possam tratar dos assuntos dos internos. De acordo com a chefe da Crê-Ser, as placas estão guardadas e serão reafixadas após as obras. Ela também afirma que os materiais de construção foram comprados segundo as regras legais da cotação de preços, sem preferência por marcas.

Nenhum bem da fundação foi utilizado para fim pessoal ou político, garante Naira Ananias. Ela diz que não tem tempo para fazer campanha quando está na fundação, veda qualquer conversa sobre eleições dentro da entidade, e garante que nunca sequer utilizou o celular corporativo fornecido pela Prefeitura, preferindo usar o seu telefone pessoal. A nova chefe da Fundação Municipal Crê-Ser admite que pediu que auxiliares de serviços gerais lavassem os carros da entidade, mas que, como eles nunca haviam desempenhado aquele serviço, não se sentiram seguros para fazê-lo, então nenhum veículo jamais foi limpo por eles.

EPIs

À reportagem, Ananias assegurou que todos os funcionários recebem equipamentos de proteção individual na prevenção à Covid-19, lacrou os bebedouros, e mostrou frascos de álcool, máscaras descartáveis e jalecos entregues durante as visitas. Os trabalhadores dos grupos de risco permanecem afastados do serviço presencial. Aqueles que trabalham nas obras receberam os itens de segurança. Sobre o uso dos carros oficiais, a diretora-presidente diz que se desloca da fundação para a Prefeitura, que fica bem em frente ao seu apartamento, mas que jamais se utilizou delas para benefício pessoal. Naira ainda diz que o motorista tomou banho em um banheiro externo (não o das adolescentes) com sua autorização, após ficar muito sujo com o trabalho na obra do muro. Já em relação ao caso de que um motorista saltou o muro para entrar na fundação após uma festa na casa de Ananias, ela diz que não tem conhecimento algum de episódios deste tipo, e que jamais realizou festa alguma em seu apartamento. Ele simplesmente teria chegado mais cedo no serviço e esperado a sua hora de ingresso para bater o ponto e começar a trabalhar. Ela diz ainda que desconfia que o relatório do vigia sobre a ocorrência possa ter sido furtado, e prometeu abrir uma sindicância para apurar o caso.

Convidada a dar mais declarações sobre as denúncias, a diretora-presidente da Fundação Crê-Ser diz que está reestruturando a entidade, reformando estruturas deterioradas da instituição, além de investigar denúncias de maus-tratos a internos da entidade durante gestões anteriores. Ananias, no entanto, isenta a anterior chefe da instituição, Helenita Melo Lopes, de ter conhecimento sobre episódios de agressões a assistidos.
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